quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Yo, tambíen

Como sempre digo, tenho a impressão de que certas coisas acontecem comigo exatamente quando têm que acontecer. Superstição? Pode ser, porém não é sobre isto que quero escrever, sim sobre o filme “yo, también”, que há vários dias estava querendo assistir quando uma amiga me chamou para irmos ver.

Veja bem: eu quase não assisto TV, de modo que, dia desses, querendo dar um descanso aos neurônios, me esparramei no sofá da sala e liguei a televisão. Besteirol e séries formato americano: como não sou masoquista, sai pra lá! Me sobram os canais de cultura e documentários. Dentre os filmes que exibiriam em breve nas telas não-convencionais, ouvi falar de “yo, también”, de Álvaro Pastor e Antonio Naharo, filme espanhol que trata, além de amor e amizade, também do tema da integração de pessoas que têm síndrome de Down.

De acordo com informações do site oficial, este filme ganhou vários prêmios, incluindo o Goya 2010 de melhor atriz principal (Lola Dueñas, que interpreta Laura) e melhor canção (Guille Milkyway).

Vamos à história: Daniel Sanz, um jovem de 34 anos, é o primeiro europeu com síndrome de Down a conquistar um diploma universitário. Em seu primeiro emprego, numa repartição pública, conhece a colega Laura, por quem se interessa desde o primeiro dia. Com a convivência, os dois vão se tornando grandes amigos. Os problemas começam quando a família de Daniel e a própria Laura, que é uma mulher livre e amável, porém muito solitária e marcada por um conflito familiar, começam a se dar conta dos planos de Daniel no tocante ao amor.

Daniel Sanz é interpretado por Pablo Pineda, vencedor da Concha de Prata na categoria de melhor ator no Festival de San Sebastian 2009. Portador da síndrome de Down, em quatro anos Pablo conquistou seu diploma universitário em Educação e Serviço Social e hoje trabalha com Educação Especial.

Impressões: “yo, también” é um filme interessante não apenas pela temática, também pelos diálogos, trilha sonora e montagem. É um filme para fazer pensar nos problemas práticos da integração de deficientes, e na forma como a sociedade reage, questionando também o conceito de “ser normal”. E faz isso de forma leve, e com pitadas de humor. Não reproduzo alguns diálogos que me arrancaram risos para não estragar a surpresa de quem ainda não viu e quer ver – talvez exibam no Brasil ou até já tenha sido exibido, pois o filme foi lançado em 2009. Seja como for, vale a dica.

Talvez o filme mostre alguns aspectos da integração de forma açucarada, não sei, pois não tenho experiência no convívio com portadores da síndrome de Down. Conheço, porém, um casal cuja filha é portadora. A mãe, uma pessoa muito bem informada, me disse certa vez que não via vantagens na integração com “normais”, sob o argumento de que nem todos os afetados reagem tão bem à constatação das diferenças, o quê, no fim, pode lhes causar muito mais sofrimentos que benefícios, e por isso ela defende a necessidade de programas especiais.

A filha é maior de 25 anos, trabalha e, ao que tudo indica, está se preparando para trocar em breve a casa dos pais por um apartamento, num condomínio especialmente projetado para portadores da síndrome, onde, espera-se, possa viver com mais independência.

Em suma, um filme humano, que me fez pensar sobre vários aspectos da integração, e montado de forma tão sensível que certas cenas não deixam de ocupar um lugar especial em minha galeria de recordações.


Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 19/08/2010
Código do texto: T2447360


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